O ARREPENDIMENTO DO ADQUIRENTE NOS CONTRATOS DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA E LOTEAMENTO – A RESCISÃO CONTRATUAL IMOTIVADA OU POR CULPA, SEJA DA INCORPORADORA OU DO ADQUIRENTE – A LIMITAÇÃO DO RISCO MÁXIMO DO COMPRADOR FACE À LEI Nº 13.786/2018 (LEI DO DISTRATO)

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É notório que no decorrer da última década, houve um aquecimento no mercado imobiliário, especialmente quanto à aquisição de imóveis “na planta”, ou aqueles situados nos chamados loteamentos “fechados” com infraestrutura.

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Em razão das condições diferenciadas para este negócio, muitas pessoas saíram em busca da casa própria, especialmente para aqueles lançamentos que se enquadravam no Programa “Minha Casa Minha Vida”.

Entretanto, a economia que estava aquecida no início da década passada, e possibilitou o aumento das negociações imobiliárias, acabou sofrendo com a crise, que abalou de forma reconhecida o mercado brasileiro, refletindo de modo geral em todas as áreas.

Os negócios imobiliários dessa natureza se avolumaram no Judiciário, seja em razão do descumprimento dos contratos pelas incorporadoras, seja pelo inadimplemento pelos adquirentes em relação ao preço do negócio.

As regras para a rescisão dos referidos contratos, até o advento da Lei do Distrato, não estavam estabelecidas na legislação, de sorte que, levado o litígio para o Judiciário, a jurisprudência foi delineando as formas para cada situação apresentada.

 

Discutia-se, em sua maioria, a aplicação de multas e penalidades àquele que infringisse o contrato, versando quanto à incorporadora, no atraso na entrega da obra. Quanto ao adquirente, o litígio comumente tratava da retenção dos valores pagos no decorrer do contrato, com aplicação de multa que onerava o comprador, e que, não raras vezes, ainda se mantinha inadimplente com a incorporadora, ou seja, perdia o valor que havia pago e ainda era devedor.

Diante disso, observou-se a necessidade de um regramento para tais situações e no final de 2018 foi sancionada a Lei Federal nº 13.786/2018, que trouxe alterações à Lei nº 4.591/1.964, que trata da incorporação imobiliária, e à Lei nº 6.766/1.979, que trata do parcelamento do solo urbano, o que em linguagem não técnica é denominado de venda de imóveis “na planta” e venda de lotes nos quais há alguma infraestrutura mínima.

É certo que os contratos são feitos para serem cumpridos, porém, os reiterados casos de desistência unilateral dos adquirentes de imóveis, seja por sua própria culpa ou, ainda, da incorporadora, fez com que a jurisprudência, e mais recentemente a lei, passasse a permitir tal postura, disciplinando, contudo, as hipóteses específicas para que o direito de arrependimento do comprador seja exercido.

 

A exemplo, tem-se o art. 67-A, da Lei nº 4.591/64 (incluído pela Lei nº 13.786/18), que atualmente prevê em seu §10º, que os contratos firmados em estandes de vendas e fora da sede do incorporador permitem ao adquirente o exercício do direito de arrependimento, durante o prazo improrrogável de 7 (sete) dias, com a devolução de todos os valores eventualmente antecipados, inclusive a comissão de corretagem.

Assegura-se, portanto, ao adquirente do imóvel, desde que os contratos tenham sido firmados em estande de vendas e fora da sede do incorporador, o arrependimento do negócio, com a devolução integral dos valores eventualmente recebidos, com maior relevância, inclusive, da comissão de corretagem.

Outras hipóteses de resolução do contrato, trazidos pela norma, são aquelas dos artigos 43-A e 67-A, da Lei 4591/64, que disciplinam os casos de culpa do incorporador e do adquirente, respectivamente.

O tema de maior relevância quanto à culpa da incorporadora pela rescisão do contrato se atém ao atraso na entrega da obra, contraposto à cláusula de tolerância, comumente estabelecida no máximo de 180 (cento e oitenta) dias do termo previsto. Ou seja, após vencida a data indicada no contrato para entrega do bem, a incorporada possui mais 6 (seis) meses para cumprir o contrato sem caracterizar sua mora, independente da natureza do atraso.

Neste ponto, introduziu a Lei do Distrato, em relação à culpa do incorporador, a regra do art. 43-A, pelo qual a entrega do imóvel em até 180 (cento e oitenta) dias corridos da data estipulada contratualmente, como data prevista para conclusão do empreendimento, desde que expressamente pactuado, de forma clara e destacada, não dará causa à resolução do contrato por parte do adquirente, nem ensejará o pagamento de qualquer penalidade pelo incorporador.

Mas se o prazo de tolerância for ultrapassado, como fica a situação do adquirente?

O citado art. 43-A prevê, atualmente, em seu §1º, que se a entrega do imóvel ultrapassar o prazo estabelecido de 180 (cento e oitenta) dias, desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá promover a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos e da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do §8º do art. 67-A da Lei nº 4.591/64.

Significa que, havendo atraso superior a 180 (cento e oitenta) dias pelo incorporador, e desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, pode este pedir a resolução do contrato, cumprindo ao incorporador devolver a integralidade do que houver recebido até o momento, além de multa estabelecida em contrato, acrescidos de correção, com base no índice contratualmente estabelecido para a correção monetária das parcelas do preço do imóvel.

Noutro bordo, questiona-se, e se ao revés da incorporadora, for o adquirente o inadimplente?

Nesta hipótese, socorrem as regras do art. 67-A, que permite a resolução do contrato por inadimplemento absoluto de obrigação do adquirente, estipulando em seus incisos e parágrafos as eventuais penalidades e multas daí decorrentes em favor do incorporador, assegurando, entretanto, uma limitação para o endividamento do consumidor, quando da rescisão do contrato.

Rescindo o contrato, em relação à devolução dos valores pagos, o inciso II e o §3º do mencionado artigo dispõem patamares máximos de retenção dos valores pagos, para serem utilizados como multas, estipulando um teto de 25% quando não houver afetação patrimonial e 50% quando houver.

E o que é a afetação do patrimônio?

Consiste em afastar a possibilidade de que outros credores alheios à relação de incorporação imobiliária possam executar créditos que porventura tenham com o incorporador, pois os imóveis “na planta” não entram no patrimônio geral do incorporador, por expressa previsão do art. 31-A da Lei de Incorporações Imobiliárias.

 

Mas, quanto ao consumidor, quais são as consequências e riscos quando ele der causa à ruptura do contrato? Pode ocorrer de, além de não ter mais o imóvel, continuar endividado?

Como mencionado acima, mesmo quando o consumidor dá causa à rescisão do contrato, o incorporador tem que restituir o valor pago, porém, da restituição serão abatidos diversos valores previstos no art. 67-A da Lei nº 4.591/64, como a multa compensatória, o valor de fruição do imóvel, as cotas condominiais não pagas etc.

Assim, visando coibir o endividamento dos consumidores e assegurar as incorporadoras, por sua vez, que não haja prejuízo, o legislador, no §4º do art. 67-A da Lei nº 4.591/64, limitou a retenção de valores a 100% do valor pago pelo consumidor, excluindo deste montante os valores de fruição do imóvel, os quais não se sujeitam a esse teto.

 

Diante disso, os valores de fruição do imóvel deverão ser integralmente suportados pelo consumidor, ainda que eles excedam o montante pago por ele, frisando, outrossim, que os valores adimplidos pelo adquirente no decorrer do contrato também irão observar indenização pela incorporadora em razão de sua fruição, podendo haver, portanto, uma compensação dos valores.

Esclarecido isso, de acordo com a legislação atual, ao assinar um contrato de aquisição de imóvel “na planta”, na pior das hipóteses, o adquirente perderá tudo quanto pagou e, ainda, poderá dever os valores relativos à fruição que teve do imóvel.

Traduz-se, pois, o risco máximo do adquirente na garantia de não ficar com saldo devedor remanescente após o fim do contrato por culpa sua, salvo os valores referentes à fruição do imóvel.

 

Observa-se que neste artigo não foram exploradas todas as inovações trazidas pela Lei do Distrato, cingindo-se tão somente ao risco máximo do consumidor que vier a se tornar inadimplente, dando causa à rescisão contratual. Todavia, há, ainda, outros aspectos a serem explorados, conforme o caso, e que poderão ser esclarecidos por nossa equipe de profissionais.

 

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DRA. FERNANDA PAULA ZUCATO
OAB/SP 165.911

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